domingo, 11 de março de 2018

Nos Cinquenta Anos da Secção de Cinema do F. A. C.





 Do espólio do autor. Imagem retirada do cartão de sócio, cedido gentilmente pelo Ex.mo Sr. David Vieira de Castro, então sócio n.º 735 da respectiva secção.



NOS CINQUENTA ANOS DA SECÇÃO DE CINEMA DO FAC
A CONTRA-CULTURA FAMALICENSE NOS ANOS 60


Por Amadeu Gonçalves


“… quando assumi a Presidência da Direcção do Famalicense Atlético Clube…, procurei imprimir à sua gestão uma índole democrática e torna-la uma porta aberta a todas as iniciativas culturais e desportivas de interesse para a nossa terra. / Assim, acolhi favoravelmente a sugestão do Dr. Macedo Varela , Dr. Joaquim Loureiro e José Augusto Rego…, de fundar um Cine-Clube, como uma secção integrada na colectividade, mas com autonomia administrativa e financeira.”

Eugénio Mesquita, “Momentos de Resistência: Depoimentos”, 2000

“O Cine-Clube de Famalicão – como era conhecido dentro e fora do concelho – desenvolveu e estreitou relações com outras organizações congéneres, designadamente com os Cine-Clubes do Porto, Guimarães e Coimbra. / As sessões realizavam-se no ex-Cinema Augusto Correia… / A maioria das exibições dos filmes era precedida de breves intervenções explicativas do filme e do seu realizador.”


Macedo Varela, “Momentos de Resistência: Depoimentos”, 2000


Na realidade, com o fim do Salão Olympia em Abril de 1962, tendo sido transmitido o filme “O Dinheiro dos Pobres” (de Artur Semedo, do ano de 1954, com António Silva, Armando Cortez ou Isabel de Castro), mais propriamente a 29, e com a inauguração do Famalicense Cine-Teatro em Maio de 1962, com o filme “Os Canhões de Navarone” (de J. Lee Thompson e Alexander Makendrick, do ano de 1961, com actores como Gregory Peck, Anthony Queen ou a actriz Irene Pappás, entre outros), o qual passaria nos dias 27 e 28, a realidade cultural famalicense, no início dos anos sessenta não terá grandes alterações: o cinema português, centrado na comédia de costumes, oriundo dos finais da I República e início da ditadura militar; a projecção construtiva das salas de cinema um pouco por todo o país, não fugindo V. N. de Famalicão como exemplo, caso do Cine-Teatro), nas quais o cinema estrangeiro, particularmente o norte-americano, ganha as suas evidências (tendo neste momento um levantamento fílmico entre 1962 até 1989, faltando ainda o seu estudo sistemático), passando, no início de cada sessão, documentários pedagógicos e políticos para a propaganda de Portugal, tida como a fase documentarista portuguesa; o pouco teatro que passa por V. N. de Famalicão, salvando-se, em 1959 o Teatro de Ensaio Raúl Brandão, em 1959, num espectáculo promovido por Santos Simões e incorporado, espante-se, nas Festas Antoninas de 1959; em 1965 Raul Solnado com a sua Companhia, em 1966 a Companhia de Vasco Morgado, vindo novamente em 1968 com Laura Alves, e esta com a sua Companhia em Abril de 1972, o panorama cultural famalicense altera-se a partir dos meados dos anos sessenta. Mesmo com a inauguração do Teatro Narciso Ferreira, em Riba d`Ave, com o filme “Fátima, Terra de Fé”, de Jorge Brun do Canto, de 1943, o panorama não se altera. Se na cultura popular os famalicenses retomam as “Festas Antoninas” no seu segundo ciclo, mas numa imagem salazarista e ruralista, pontificando o Ateneu Comercial e Industrial com os seus serões culturais e as suas homenagens personalísticas, novos espaços de socialibilidade e de culturabilidade irão nascer em V. N. de Famalicão a partir dos meados dos anos sessenta: é o caso da Biblioteca Móvel da Gulbenkian (1966, mas já oriunda como Biblioteca Itinerante n.º 8, dos finais de 158); do Centro Académico de Famalicão (1966), a secção de cinema do Famalicense Atlético Clube (1968), a Livraria Fontenova (1969) e a Livraria Júlio Brandão (1971), a Cooperativa de Consumo Cooprave de Riba d`Ave (1970) e, nos inícios dos anos 70, o nascimento da Associação do Teatro Construção, em Joane (Artur Sá da Costa, “Resistência Cultural ao Fascismo as décadas de 60 e 70 no concelho de Vila Nova de Famalicão”, 2000). 




Foto retirada do jornal “Estrela da Manhã”, de 27 de Maio de 1962.


De qualquer maneira, pontificando apenas com estes exemplos primordiais, e tomando o que aqui me traz, os cinquenta anos da Secção de Cinema do Famalicense Atlético Clube, recordo os corpos-gerentes do ano de 1968 nos quais nasceram a respectiva Secção:



1968

Assembleia-Geral
Presidente, Padre António Guimarães
Vice-Presidente, Luís Gonçalves
Secretário, Joaquim José Correia

Direcção
Presidente, Eugénio Mesquita
Vice-Presidente, Luís Santos
1.º Secretário, Manuel Início Lima
2.º Secretário, Rodrigo Veloso
1.º Tesoureiro, Camilo Veloso
2.º Tesoureiro, Manuel António Lopes
Vogal, Aires Balsemão Barbosa

Conselho Fiscal
Presidente, Álvaro Gil Marques
Relator, Simpliciano Fernandes
Secretário, António Barbosa


Por seu turno, a direcção enviaria ao jornal “Estrela da Manhã” o seguinte comunicado, o qual seria publicado em 20 de Janeiro:

“A Direcção do F. A. C. tem o prazer de comunicar a todos os associados e ao público em geral que, no exercício da sua actividade cultural, vai proceder à criação duma secção de cinema. / Logo que esta secção seja aprovada em Assembleia-Geral, a mesma entrará em funcionamento, se possível no próximo mês de Março. / Todas as pessoas poderão ser associadas da secção de cinema, mediante o pagamento mensal de 12$50, tendo os sócios do F. A. C. u m desconto de 2$50. As quotas só começarão a ser pagas quando a secção funcionar. / Esta secção proporcionará, aos respectivos associados, duas sessões de cinema por mês. / Todas as pessoas que se quiserem escrever esta secção, poderão fazê-lo nas listas existentes a sede do F. A. C., o Centro Académico de Famalicão e a Confeitaria Moderna. / A Direcção do F. A. C. espera o melhor acolhimento por parte de todos, para esta iniciativa cultural.”

Na realidade, a primeira sessão de cinema decorreu a 15 de Março de 1968 com o filme “Ricardo III” de Laurence Olivier, precedida por uma palestra proferida por Henrique Alves Costa, enquanto a segunda foi no mesmo mês, a 29. Os famalicenses saberiam do acontecimento da seguinte forma, no jornal “Estrela da Manhã”, em 9 de Março:

“No próximo dia 15, pelas 21h30, o Cine-Teatro Augusto Correia, inaugura a Secção de Cinema do F. A. C. as suas actividades com a exibição do célebre filme “Ricardo III”. / O filme será precedido de uma curta palestra proferida pelo sr. Henrique Alves Costa, fundador e dirigente do Clube Português de Cinematografia e conhecido crítico cinematográfico.”


Mas, para além dos nomes que Eugénio Mesquita cita em epígrafe, Macedo Varela vai mais longe e aponta outros jovens que deram corpo ao projecto, lembrando Eduardo Perez Sanchez, Telmo Machado, Artur Sá da Costa, Manuela Granja, António Cândido, entre outros.




Biblioteca Municipal Camilo Castelo Branco, Fundo Local, Espólio Joaquim Loureiro



Ao longo de quatro anos, até Abril de 1972, tendo sido o último filme “Duelo no Pacífico”, foram aparecendo filmes de John Ford, René Clair, Claude Chabrol, Jean Renoir, Ingmar Bergamn, Jean Luc Godard, Todashi Mita, François Truffaut, Roman Polanski, Joseph Leo Mankiewicz, John Huston, Frederico Fellini, Jacques Tati, Alfred Hitchcock, entre outros. Em cada sessão, a secção de cinema distribuía um folheto de quatro páginas, ilustrado, os quais, para além da ficha técnica do respectivo filme, possuía textos interpretativos não só do realizador, como do respectivo filme e do que diziam do mesmo. Muitos desses textos eram retirados da “História do Cinema Mundial”, de George Sadou, ou, entre outros autores, conforme o filme apresentado, caso de Jean Mitry, Pierre Billárd, Lauro António, Júlio C. Arete, Vasco Pinto Reis (a propósito da nova vaga cinematográfica), Gilbert Salachas, Eisenstein, Eduarda Geada, entre outros, ou de revistas cinematográficas, caso da “Vértice”, “Nuestro Cine”, “Films ad Filming” ou “Télé-Cine”. Muitos destes folhetos encontram-se na Biblioteca Municipal Camilo Castelo Branco. Novas visões cinematográficas para uma nova interpretação de um mundo em mudança.









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