domingo, 27 de maio de 2012

maçonaria oitocentista em portugal



O convidado de mais uma conferência do Ciclo dedicado à Maçonaria, António Lopes, enalteceu a atitude cívica destes encontros, congratulando-se pela sua presença no Museu Bernardino Machado. Para António Lopes, não há perguntas muito difíceis para a Maçonaria, podendo haver uma ou outra. Pretendendo transmitir sobre “o que é isto, a Maçonaria”, inicia por clarificar o auditório que a Maçonaria é um grupo de pessoas, homens e mulheres, uma organização masculina e feminina, para se discutir e se falar de tudo. Tem como fim o combater preconceitos para sermos verdadeiramente livre-pensadores. A Maçonaria, que nasce no século XIX, é fruto de uma mudança política, cultural e social da Europa, sendo a causa e a consequência dessa mudança, indo buscar as lendas e os símbolos para os seus rituais à cultura. E se nasce em Inglaterra em 1717, na Maçonaria tudo se pode discutir, menos religião e política. Sempre que meteu a política e a religião, a Maçonaria sempre se deu mal.
António Lopes e Norberto Cunha
Com uma organização rudimentar na sua fase inicial em Portugal (conhecendo-se, apenas, duas lojas, A Casa Real dos Lusitanos e os Hereges Mercadores), as reuniões maçónicas iniciais realizavam-se em casas de particulares, o que tem uma consequência, o facto de serem itinerantes (constituindo, hoje, uma falha na documentação histórica); existia, igualmente, uma conflitualidade nas lojas maçónicas, sobre as questões de ordem ritual e, acima de tudo, a falta de uma estrutura central, apesar da existência de um Corpo Maçónico, que reunia a direcção das lojas então existentes em Portugal e as defendiam dos ataques por parte da Inquisição.Com a criação do Grande Oriente Lusitano (1802), no qual existia tanto o rito francês, como o inglês, existindo uma Maçonaria portuguesa até às invasões francesas e uma outra após as mesmas. Para além disto, na estruturação da Maçonaria no início do século XIX surge um conjunto de repressões perante a mesma instituição.
Não havendo documentos suficientes que comprovem a implicação da Maçonaria perante a Revolução Liberal de 1820, e nas relações do Sinédrio com a Maçonaria, surgindo, ao mesmo tempo, em Portugal a Carbonária, de tendências francesas, surgiram vários problemas de ordem social e cultural, e mesmo de mentalidade, perante a Constituição de 1822, nomeadamente a posição do Cardeal Patriarca de então, para o qual não se podia reconhecer a igualdade entre os homens, com o argumento de que se a mão tem cinco dedos todos eles diferentes, logo os homens não podem ser todos iguais. O que surgiu com a respectiva Constituição de 1822, foram algumas reacções, nomeadamente, por exemplo, a de Francisco Faria e Maia, para o qual os intelectuais aliaram-se da realidade, esquecendo a educação para o povo para a mudança da sociedade. Alias, para o Prof. António Lopes, Portugal andou sempre ao sabor dos ventos do liberalismo europeu, tendo sido um dos seus combatentes, de tal realidade, o P. José Agostinho de Macedo, surgindo com o miguelismo duas correntes: o liberalismo e o absolutismo.


António Lopes, num dos momentos da sua conferência
Do Brasil, após a vinda da corte, a Maçonaria adoptou o rito escocês, enquanto que da França e da Inglaterra surgiram novas ideias, vindo, particularmente de França, a Carbonária, conforme já se disse. Para o Prof. António Lopes, há várias carbonárias consoante as épocas. Em 1834 há um novo crescendo da Maçonaria, surgindo, ao mesmo tempo, cisões e divisões internas, devido, precisamente, às várias obediências então existentes, e mesmo perante o sistema político (existindo então as sociedades patrióticas, daqui nascendo os partidos políticos), que se começa a organizar em Portugal por meados do século XIX, com a Regeneração, estando em campo cabralistas e setembristas.
Uma das diferenças da Maçonaria da de hoje perante a emergente em meados do século XIX, está na força, na beleza e na sabedoria com aquilo que se discutia e se falava nas reuniões maçónicas. A Maçonaria, então, aproxima-se dos grémios e das associações culturais e cívicas de oitocentos, tendo como obrigação social ensinar a ler e a escrever. Será, essencialmente, a partir dos anos 70 que a Maçonaria se aproxima do movimento republicano, juntando então monárquicos e republicanos, ambos estando presentes nas respectivas associações e nos respectivos grémios. O que une, segundo António Lopes, esta geração é o altruísmo político em todos os quadrantes para o bem comum, estando em causa a participação cívica, ficando assim a pessoa mais completa.

Um aspecto do auditório

segunda-feira, 21 de maio de 2012

museus em mudança




Enquanto que no Dia Internacional dos Museus, o Museu Bernardino Machado recebeu, no dia 18 de Maio, à noite, a  actividade “Música no Museu”,  uma actividade da “Arte90” em colaboração com a Câmara Municipal de V. N. de Famalicão e o respectivo Museu, por seu turno, na “Noite dos Museus” (dia 19), para além da participação da ArtEduca (com os jovens músicos Rui Amorim, António Ferrão, Diogo Santos e Luís Azevedo), realizou-se a conferência “MUDEM-ME: Museus Desesperadamente em Mudança… Metodologias a explorar”, de Paula Menino Homem.
Pegando na temática do ano, “Museus Num Mundo em Mudança: Novos Desafios, Novas Inspirações”, Paula Menino Homem começou por explorar os vários agentes perante essa mesma mudança, focando inicialmente a diversidade de museus, as suas colecções e o pública que os visita, assim como os seus respectivos problemas. Questiona o factor público, isto é, que tipo de público se tenciona chamar aos museus, não esquecendo a democratização do acesso ao património. Desta forma, partindo do princípio de que há sempre qualquer coisa que chama atenção para as pessoas irem aos museus, a problemática do público é uma questão interessante, na medida em que é uma questão de território, os museus, na expressão de Paula Menino Homem, andam à “caça” do seu público-alvo. Uma outra questão a saber é se os museus são apelativos, colocando aqui a ênfase na família, isto é, até que ponto os pais colaboram com os filhos nas visitas aos museus. Um outro problema que os museus enfrentam diz respeito, na expressão da conferencista, dos “emplastros”, já que “para os meus são os investigadores”, estando aqui em causa o tipo de gestão documental que os museus têm mente. Outro género de problemas são os níveis de humidade, os factores poluentes, a iluminação das colecções, o ambiente interno, o qual tem de ser um ambiente ~equilibrado, e ter atenção ao público “atrevido”. Todas estas situações dizem respeito àquilo que os museólogos denominam de “gestão de risco”.
O problema principal que surge, então, perante essa gestão de risco, é saber como é que os museus vão mudar perante a diversificação de públicos e perante a falta de financiamento. O primeiro ponto que a conferencista salienta é conquistar territórios, sendo os espaços da cidade onde os museus se integram uma nova perspectiva de interactividade entre os museus e a comunidade na qual estão inseridos. É um problema tão simples e, ao mesmo tempo, complexo, até porque o trabalhar em rede e em conjunto é uma falsa questão. O de trabalhar em grupo de uma forma interdisciplinar. Para a conferencista Paula Menina Homem, a vontade de mudar é na inter-ajuda entre todos os diferentes museus, é o trabalhar em rede onde os museus estejam inseridos. O sentido de sobrevivência é os museus saírem à rua, realidade que já acontece. O esforço de uma união para uma interdisciplinariedade museológica é a proposta da conferencista para uma concretização dos museus no espaço citadino a que pertencem.












sexta-feira, 18 de maio de 2012

maçonaria portuguesa, século xix


A IV Conferência do Ciclo de Conferências “A Maçonaria em Portugal: do século XVIII ao século XXI”, organizado pelo Museu Bernardino Machado, tem, desta vez, como convidado o Mestre em História do Século XX António Lopes, com a tese subordinada ao tema “A Maçonaria em Portugal e os Açores 1792-1935”.
Director do Museu Maçónico Português entre 2003 a 2011 (tendo efectuado uma profunda intervenção em matéria de investigação, apresentação e conservação do seu espólio, assim como na imagem e na comunicação, tendo sido, aliás, o Museu reconhecido internacionalmente entre os seus congéneres a nível europeu. Merecendo, igualmente, da Câmara Municipal de Lisboa a distinção de ter sido considerado um equipamento de relevante interesse cultural e turístico para a cidade), António Lopes é Presidente da Associação Portuguesa de Arte Fotográfica e Director da revista “Grémio Lusitano”, desde 2008.
Co-autor do “Dicionário de História da I República e do Republicanismo”, numa edição da Assembleia da República e em vias de publicação, António Lopes já publicou “República e Republicanos em S. Miguel” (2011), “A Maçonaria Portuguesa e os Açores 1792-1935” (2008) e “Gomes Freire de Andrade – um retrato do homem e da sua época” (2003) e foi co-autor do livro “Amor da Pátria” (2010), livro que representa uma história da Maçonaria na ilha do Faial, e coordenador e autor da obra “A Maçonaria  a Implantação da I República” (2009), livro este editado pela Fundação Mário Soares e pelo Grémio Lusitano.
Para além de já ter participado em várias conferências e colóquios, cujas temáticas têm incidido particularmente sobre a I República, a Maçonaria e a Fotografia, António Lopes é Director da Escola de Fotografia da Associação Portuguesa de Arte Fotográfica, assim como coordenador e professor desde 1998.
Neste âmbito, e paralelamente à actividade de historiador, António Lopes é crítico de arte e de fotografia para a revista “Artes e Leilões”, jornal “Expresso” e a “Capital”, tendo igualmente vários artigos sobre a história da fotografia em Portugal em revistas, tais como, por exemplo, “Foto e Fotografia”. Realça-se nesta sua actividade o trabalho “Histórias de Cavalos de Ferro”, levantamento fotográfico e histórico do património ferroviário português desactivado, tendo sido considerado de “relevante interesse cultural” pelo então Ministério da Cultura, e cujo trabalho foi apoiado por diversas entidades, nomeadamente o Centro Português de Fotografia.
A conferência de António Lopes com o título “A Maçonaria no Século XIX, em Portugal”, tem início às 21h30 no Museu Bernardino Machado, de Vila Nova de Famalicão, no próximo dia 25 (Sexta-Feira)sendo a entrada gratuita e tendo os participantes o respectivo certificado de presença.
De relembrar que as conferências deste V Ciclo são acreditadas pelo Conselho Científico da Formação Contínua de Professores, nomeadamente para os professores de História, Filosofia e de Sociologia.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

v. n. de famalicão na "ilustração católica" (1914-1916)




Esta vila poética como todas as do norte, é uma das mais importantes. / É uma vila moderna em tudo e por tudo. / Ela tem como em todas as vilas, as suas feiras semanais e anuais, que são muito concorridas por feirantes de todo o país. / O seu comércio tem-se desenvolvido bastante, havendo nos arredores algumas fábricas de tecelagem, com grande número de empregados, assim como uma importanmteb fábrica de relógios. / Isto concorre muito para o de~senvolvimento daquela vila. / À distância de uma légua, pouco mais ou menos da vila, há uma estância balnear de águas sulfurosas, que são muito aconselhadas para as doenças da pele e bronquites. / O viajante que visita esta vila fica bem impressionado com seu aspecto ligeiro. / Famalicão tem ruas largas e desafogadas, praças espaçosas e os edifícios não têm aparência muito pesada. / Do Concelho têm saído grandes homens, que têm exercido lugares de destaque na sociedade. / Entre eles houve um que se distinguiu nas letras. / Foi o grande escritor Camilo Castelo Castelo Branco. Nasceu numa humilde aldeia vizinha e foi lá entre as árvores copadas do que lhe pertencia, que ele escreveu algumas das suas melhores obras e onde há poucos anos acabou para o mundo.




domingo, 13 de maio de 2012

platão e vieira da silva



"Pois o alvo do Amor não é de facto o Belo, como tu supões, Sócrates...»
Emtão qual é?
Gerar e criar no Belo!»

Diotima a Sócrates








quarta-feira, 9 de maio de 2012

portugal moribundo


Numa altura em que falta a Portugal não só uma consciencialização histórica, mas igualmente cultural (hoje, para espanto meu, numa visita que realizei no Museu Bernardino Machado a alunos de uma escola profissional, do curso de mecânica, e que possuíam o módulo de "Cidadania e Democracia", nenhum sabia quem era Aquilino Ribeiro!!!), o livro de Miguel Real, com três capítulos específicos, a saber, i) "O Espírito da Europa", ii) "O Fracasso Histórico de Portugal" e iii) "A Vocação Histórica de Portugal" é mais do que oportuno neste presente sem sentido. Tal significa que existe muito trabalho para fazer!!!


"... defendo um Portugal democrático tanto na política, como na cultura, como no pensamento, como na fé. O unanimismo [...] tem sido, ao longo da história, o argumento fundador de todas as inquisições, autoritarismos e ditaduras." (18)

"A ideia de vocação histórica concentra-nos na avaliação  e valorização dos nossos talentos, predisposições, competências, capacidades demonstradas para aproveitar as oportunidades e, ao mesmo tempo, enfrentar e superar as vicissitudes que se nos têm deparado na nossa caminhada histórica de vida em comum, autónoma, que poderemos olhar de forma decidida para os desafios do presente e dar-lhes uma resposta, tendo por referência aquilo que de melhor soubemos fazer no passado, em momentos tão ou mais difíceis do que os de agora. / Miguel Real, acredita e aposta firmemente na capacidade redentora e regeneradora da liberdade, uma liberdade que potencie as energias, os talentos, a vocação criadora dos portugueses para superarem com sucesso os tempos difíceis em que vivemos. Esta é a poderosa mensagem deste livro." (20-21)

José Eduardo Franco

terça-feira, 8 de maio de 2012

bernardino machado e o titanic


Entre 20 e 26 de Abril de 1912 o jornal "O Mundo" fazia reportagens sobre o desastre do transatlântico "Titanic"; mas já antes, Bernardino Machado, senador da República portuguesa, na sessão n.º 70, a 17 de Abril, propunha (talvez a única voz) "um voto de sentimento", pelo trágico acidente de 14, nos seguintes termos: "Aproveito o ensejo de estar com a palavra para propor á Câmara que seja aprovado um voto de sentimento pela catástrofe que acaba de dar-se e que comoveu o coração de todos os povos. / Refiro-me ao naufrágio do grande transatlântico Titanic."
 Coloco aqui algumas das fotografias que o jornal "O Mundo", então publicadas no "Excelsior", reproduzia, para memória histórica de acontecimento tão funesto. Mas da história tira-se sempre liçoes, e se do filme, ficção ou não, se retira, por um lado, a perspectiva do humano enquanto construtor de metáforas para sua glória, sendo esta metáfora, neste nosso caso, a da grandiosidade pela técnica, tal qual Wells na sua máquina do tempo, ou na do Dr. Moreau, pela criação do humano que se transforma em monstro, por outro lado, na ficção cinematográfico, depara-se, na tragédia, com aquilo que do pior o humano tem: a indiferença por aquilo que é verdadeiramente humano, qualificando-se esta mesma indiferença não só no "ser", mas no ter. Eis o problema de todos os tempos, assim colocado na sua simplificação. Para o dr. Manuel Sá Marques, tendo sido o seu avô Bernardino Machado que edificou a tragédia na glorificação ontológica no Senado português, e uma das únicas vozes, nas suas simples palavras que se transcreveu, com o meu abraço de amizade fraterna









segunda-feira, 7 de maio de 2012

"o mundo" e o falecimento de manuel laranjeira


 O Mundo (24 Fev. 1912)


O Mundo (25 Fev. 1912)

manuel da silva mendes e bernardino machado

"Uma Aproximação aos Autores Famalicenses: catálogo da exposição", V. N. de Famalicão, 1998

Esta carta de Manuel da Silva Mendes a Bernardino Machado, de 10 de Novembro de 1910, mais de um mês após a implantação da República em Portugal, e que se encontra publicada no referido catálogo (e pertencente ao espólio do Museu Bernardino Machado) para além de tecer considerações profissionais, Silva Mendes informa Bernardino Machado que este é a pessoa do Governo Provisório da República em Portugal mais falada no Extremo-Oriente. Por outro lado, tece considerações políticas sobre a China, dizendo que «a Revolução que se realizou em Portugal foi comentada com imenso interesse em toda a China." E continua dizendo que "excitou muito os ânimos dos chineses principalmente os dos revolucionários, que os há em grande número - os reformistas." Contudo, hoje, no jornal "O Mundo", a consultá-lo para o III Tomo da Obra Política de Bernardino Machado, e a confirmar o material já obtido, apareceu-me este texto, que aqui reproduzo, assim intitulado "Enfim! A República Chinesa É um Facto", publicado no jornal republicano em 9 de Fevereiro de 1912. Dedico ao Dr. Manuel Sá Marques, com o meu abraço fraterno de amizade saudoso, e à Sr.ª  Anjos Mendes, o primeiro neto de Bernardino Machado, e a segunda, bisneta de Manuel da Silva Mendes.


domingo, 6 de maio de 2012

joão barrento


A entrega do Grande Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho 2011 (atribuído pela Câmara Municipal de V. N. de Famalicão) que se realizou na Sexta-Feira na Biblioteca Municipal Camilo Castelo Branco, apenas veio comprovar a originalidade de um dos ensaístas portugueses da actualidade, e que se chama João Barrento. Se a minha primeira leitura se radicalizou no livro "O Espinho de Sócrates" sob a tutela de Nietzsche para pensar a literatura e a cultura, no seu relacionamento com a filosofia, a segunda leitura foram os dois volumes "Literatura Alemã" e de seguida "A Palavra Transversal", permanecendo a ideia da literatura das ideias e aquilo que ela ainda nos pode oferecer nestes tempos conturbados, a descoberta da nossa ontologização no mundo. Hoje comprei "O Mundo Está Cheio de Deuses: crise e crítica do contemporâneo", precisamente o livro que ganhou o Prémio já citado, livro que nos fala do papel do intelectual na sociedade da hoje, do papel da cultura e da arte, do papel da literatura e do quanto todas estas actividades ainda podem trazer uma luz de esperança, sendo esta luz de esperança, nas palavras de Searle, o «background» do humano que pode transportar outro mundo. Tal como João Barrento nos fala no final da sua introdução, "falo da alma múltipla do mundo, inimiga de todas as totalizações e reduções, e que não adormece nem tem fim. Falo da visão nova de Tales, ao se aperceber de que o mundo não é coisa inerte, mas pulsa ao ritmo irregular e vivo do que nele acontece." Resta apenas agradecer a João Barrento pelas leituras sempre proveitosas para que o humano se transporte noutro mundo que não neste, o mundo aquele em que ainda se acredita na justiça e na fraternidade, na amizade e no amor, numa sociedade justa, e noutras coisas que tais. Concerteza que voltaremos a João Barrento e a "O Mundo Está Cheio de Deuses", que somos nós mesmos, o humano, nos trabalhos e nos dias.

sábado, 5 de maio de 2012

da república

Eis um livro que se lê como um romance e que nos transporta vivamente para a I República entre 1910 a 1917. Neste livro, Pulido Valente analisa a República e o País, a ascensão e queda dos radicais, isto é, os republicanos históricos, caso de Afonso Costa, Bernardino Machado e Pimenta de Castro (radical, só Castro), o regime e a guerra, o «povo republicano», o fenómeno Fátima e a contra-revolução sidonista, com o seu governo presidencialista. Começa assim: "Pouco depois do «5 de Outubro», António José de Almeida perguntou, melodramaticamente, se 300 000 republicanos chegavam para manter em respeito 5 milhões de portugueses. A pergunta era boa. Sobretudo, porque, na melhor das hipóteses, os republicanos não passavam de 100 000." A mudança social e mental, o grande projecto dos republicanos, digo, das instituições, não poderia triunfar.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

o outro lado da nação

"Este livro explora a história do uso da força por parte do Estado nos conflitos colectivos portugueses, desdee a vitória liberal de 1834 até á consolidação da democracia, em finais do século XX. E fá-lo tendo em conta duas dimensões...: primeiro, a capacidade de o Estado se afirmar no território e construir uma ordem pública, uma administração respeitada que conhece a população e o território, que cobra impostos e que assegura a vigilância da lei e o respeito pelas sentenças judiciais; segundo, os dilemas políticos implícitos no uso da força por parte do Estado e na sua justificação por parte dos governantes, sobretudo quando a coerção se abate sobre pessoas mobilizadas que pretendem defender os seus direitos, situação em que a violência do Governo é atacada ao nível da opinião pública enquanto ilegítima." (14-15)

Diego Palacios Cerezales

quarta-feira, 2 de maio de 2012

do pessimismo que o não é





"... a solução, estando nós já na Europa, não pode agora senão estar em nós..."

Miguel Real







A edição, por si só, do texto de Manuel Laranjeira "Pessimismo Nacional", censurado no Estado Novo, é de ralçar não só pelo contexto nacional, europeu e mesmo internacional em que se vive, como igualmente, por outro lado, pela significação que em si comporta perante a época em que foi publicado, nomeadamente no jornal "O Norte", entre 24 de Dezembro de 1907 e 14 de Janeiro de 1908, e a época em que actualmente vivemos, num contexto de desorientação social, cívica, económica e politicamente. E, neste sentido, a análise contextual e épocal entre os princípios do século XX e o princípio do século XXI que Miguel Real realiza, apesar de ser perigoso uma tal análise relacional, é notável, aconselhando a leitura não só do texto de Laranjeira, como o prefácio de Miguel Real, denominado "A Actualidade de Manuel Laranjeira". Paralelamente, a republicação do texto de Miguel de Unamuno "Portugal Povo de Suicidas", retoma não só o projecto inicial do próprio autor, que pretendia escrever um livro único sobre Portugal, amigo de Laranjeira e este o seu máximo correspondente sobre a realidade mental e social portuguesa de então, revela o estado social e perigoso da sociedade portuguesa (aliás, às vezes, quando leio os textos de Bernardino Machado, tiro a conclusão prática de que Portugal, em termos mentais e educacionais, assim como políticos, falando igualmente do mesmo período histórico dos textos dee Laranjeira, e até à Implantação da República, parece não ter evoluído muito!) Quando somos governados por, realçando a expressão de Miguel Real, «jovens turcos», os quais substituiram os pais fundadores da democracia portuguesa, com políticas economicamente erradas para a sociedade portuguesa, os quais em vez de realçarem a esperança, encontram-se num estado volúvel e de sem sentido em termos governativos; em vez de exercerem uma justiça de equidade fiscal, proclamam hipocritamente que todos os portugueses, salvo seja, têm de pagar o que lhes é devido, criando assim uma sociedade pública e privada; quando os «jovens turcos» se tornam Pilatos, como tem sido o caso das pontes do Carnaval ou da Páscoa, reina simplesmente o estado amoral; quando os desempregados já passam a fasquia dos 15%, os nossos governantes, em vez de criarem politicas alternativas, avisam com ar de satisfação, que o país vai ter níveis de desemprego que nunca viu e assim também não podemos esperar nada de um estado que em vez de incentivar o trabalho, para criar riqueza, promove a emigração. Aliás, conforme a metáfora da multiplicação dos pães, tal como ouvi ontem no programa da SIC contra-corrente, a divisão para a multiplicação, não parece ser uma ideia a partilhar, na medida em que como pode haver multiplicação sem divisão (e fala-se, claro está, uma vez mais, na problemática da equidade fiscal)? E o fenómeno Pingo-Doce revela o estado social português: falta de civismo, de respeito e de educação de uns pelos outros, e, por ter sido a primeira vez que uma tal promoção aconteceu em Portugal, revelou-se a anarquia social entre o cidadão consumidor que a sociedade civilizacional promoveu e o cidadão que pretende envolver-se na cidadania, assim como as dificuldades económicas em que se vive, até porque uma promoção do género não é de perder, acaba por ser um fenómeno natural, assim se criando deuses sem o serem: pois, como dizia um cidadão, no telejornal de hoje, os políticos é que estão de olhos fechados, e o dono do Pingo-Doce é que é amigo dos pobres! Aos poucos, para pecado nosso, a teocracia, já em desenvolvimento, suplanta uma democracia que está a perder a sua consciência histórica e cívica, conforme a ditam os «jovens turcos», que, em alguns passos, estão a seguir a esquerda que governou antes deles. Na expressão de Laranjeira, tudo isto não passa por ser senão uma "ficção política". Em suma, se os dois textos, o de Miguel de Unamuno e o de Manuel Laranjeira surgem num contexto social e político avassalador, o que temos de ler em ambos esses textos é uma mensagem de esperança, ler nas entrelinhas e saber interpretá-los para que a sociedade portuguesa encontre um novo caminho. Termino com Laranjeira: "Há aí incalculáveis energias armazenadas; há aí muita vida, muita saúde, à espera de aplicação útil. Aproveitem-se, canalizem-se. Há ainda alma para refazer todo um Portugal novo." E se a solução está em nós, devemos estar com os olhos postos na Europa e no Mundo.